quarta-feira, 7 de outubro de 2009

João, o arquiteto da poesia

— Tanta coisa despiste em vida

que fugiu de teu peito a brisa.
— E agora, se abre o chão e te abriga,
lençol que não tiveste em vida.
— Se abre o chão e te fecha,
dando-te agora cama e coberta.
— Se abre o chão e te envolve,
como mulher com quem se dorme.

Ele escreveu a mais bonita e sofrida obra de engenharia poética. A antológica "Morte e Vida Severina” teve várias versões no teatro e na mídia eletrônica, inclusive foi musicada pelo grande Chico Buarque. Seu autor, João Cabral de Melo Neto, nasceu em Recife e tinha parentes ilustres. Primo, pelo lado paterno, de Manuel Bandeira e, pelo lado materno, de Gilberto Freyre, ele passou a infância nos engenhos de açúcar. Aos vinte anos mudou com a família para o Rio de Janeiro onde viveu até sua morte em 1999. Poeta das dualidades, por vezes de forma obsessiva faz traçados entre tempo e espaço, deserto e fertilidade, o dentro e o fora, o masculino e o feminino. Sua poesia é cerebral, uma construção elaborada e pensada. Foi diplomata, porém nunca relegou a poesia. Com ela ganhou muitos prêmios, entre eles o Jabuti e o Luis de Camões. Este último, considerado o mais importante prêmio concedido a escritores da língua portuguesa. Esse arquiteto da poesia, com 20 livros publicados, escreveu versos assim:
[...] morte severina:
que é a morte que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia.

Malu Pedarcini

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