sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Energia da biomassa, uma solução brasileira

Por Wanderley Dantas dos Santos*

Mesmo antes do surgimento do Homem moderno (Homo sapiens), os ancestrais humanos já faziam uso da bioenergia. Os fósseis do Homo habilis, um ancestral nosso que habitou a África há cerca de 2 milhões de anos, deve seu nome às evidências de suas refinadas habilidades para produzir ferramentas e outras tecnologias, inclusive o fogo. As vantagens da utilização do fogo são evidentes. O fogo tornou disponível nutrientes que não estão prontamente acessíveis em alimentos crus. Além disso, o fogo é uma tecnologia poderosa para proteger contra o frio, a escuridão e, sobretudo, dos predadores e inimigos. Mais tarde, o homem moderno utilizou o fogo para fundir instrumentos de bronze e de ferro fundamentais para lavrar a terra para a produção agrícola e fazer surgir as primeiras civilizações (é bem verdade que também fez as armas para destruí-las...).

Embora ainda represente uma importante fonte de energia para siderurgia (e para o churrasco!), após a revolução industrial a biomassa perdeu espaço para o carvão mineral e petróleo. A queima de biomassa sólida tem aplicações limitadas. Combustíveis líquidos (como gasolina, diesel, querosene) são muito mais convenientes para o transporte e uso em pequenas máquinas como automóveis, navios e aviões. Porém, os combustíveis fósseis não podem durar pra sempre e sua queima está provocando o aquecimento global. A solução é produzir biomassa líquida como o etanol, e o Brasil é pioneiro nesta área.

Embora o motor de ciclo Otto que usamos ainda hoje nos automóveis tenha sido originalmente concebido para rodar com etanol e os primeiros automóveis Ford T rodassem com quaisquer misturas de álcool e gasolina, a primeira planta para produção de etanol nos EUA só foi construída em 1940 e para uso militar, no estado do Nebrasca. Nenhuma produção comercial foi viabilizada até meados da década de 1970. Enquanto isso, no Brasil a usina de açúcar Serra Grande de Alagoas produzia etanol combustível desde o final da década de 1920. Havia até postos de combustível, onde o etanol era trazido em tonéis de madeira. O surgimento do petróleo com seu preço convidativo logo extinguiu a precoce indústria bioenergética brasileira.

Mas, na década de 1970, após a guerra do Yon Kippur entre os paises árabes e israel apoiado pelo ocidente, um embargo da OPEP ao aliados israelenses elevou o preço do petróleo a níveis insuportáveis. Para enfrentar a crise, o governo brasileiro lançou um programa para produção de etanol em larga escala. O Pró-álcool acabou se revelando uma solução revolucionária. Muitos países adotaram programas similares para induzir a produção de etanol. Hoje, graças ao Pró-alcool, o Brasil se destaca como o primeiro país a consumir mais etanol que gasolina (2008), graças à maior frota mundial de veículos flex. Na verdade, no Brasil já não é possível comprar gasolina pura nos postos de combustível.

Embora seja possível extender muito a produção de etanol no mundo, fontes mais acessíveis de biomassa como a sacarose representam apenas uma pequena fração da energia contida na biomassa vegetal. A maior parte dos açúcares estão na forma de celulose (bagaço e madeira). A celulose pode ser quebrada em suas unidades constituintes (glicose) e fermentada a etanol. A celulose produzida anualmente pelas plantas possui cerca de 10 vezes mais energia que o petróleo consumido mundialmente a cada ano. Assim, foi iniciada uma corrida mundial para desenvolver tecnologias capazes de produzir o etanol celulósico ou bioetanol. O Brasil é um dos líderes desta corrida graças a empreendimentos como o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol, em Campinas e a centenas de laboratórios espalhados pelo país, como o Bioplan, aqui no Departamento de Bioquímica da Universidade Estadual de Maringá, onde trabalho.


* Wanderley Dantas dos Santos - Bioplan- Laboratório de Bioquímica de Plantas - Departamento de Bioquímica - UEM - Universidade Estadual de Maringá - Telefones: 55 (44) 3011-4717 - 3011-4714 - www.dbq.uem.br/bioplan.htm

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