Ai de mim - não sou moderna
Por Fernanda Fassarella*
A modernidade me assusta. Assusta quando atinge o lado do coração. O outro lado, o tecnológico, também me assusta, mas não me alcança. Não a mim, que ainda gosto do meu pedaço de mundo antigo com discos, livros usados, poesia parnasiana e um velho violão perto da rede na varanda, que é onde me enfio quando a tristeza invade. Não a mim, que busco da TV a maior distância, andando livre nos confins de umas paragens sem nome e sem leis. Eu que busco pros meus pés o chão de terra e a grama com orvalho de manhã, a ausência de sandálias e de destino, e sigo o itinerário que me manda o coração. A mim não atinge essa pouca modernidade. Essa é pros tantos que têm sede de informações e atualizações infundadas e, decerto, desnecessárias. A mim bastam as cachoeiras e suas melodias ocultas pra lavar a alma, as amizades que nascem na sensibilidade de um dia comum, os arvoredos centenários com cheiro de algodão. A mim basta o enlace das mãos na correnteza do rio, o sorriso gratuito brotando de mansinho ao amanhecer, o beijo surpresa no rosto vindo socorrer uma lágrima prestes a cair. Basta-me um pé-de-valsa na hora boa do nascer da noite, a voz que canta e pinta de azul o sono, o coro alegre do Samba-Sampaio, o copo de café num dia de chuva, as boas companhias em volta da fogueira na lua nova. A vida simples que se pode levar leva embora o susto e o medo - menos o medo desse tal amor moderno.
* Fernanda é jornalista em Cachoeiro de Itapemirim
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